quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O prazo da execução fiscal em dissolução irregular de empresa.

Por André Almeida Rodrigues

Atualmente verificamos controvérsias acerca do prazo que a Fazenda Pública dispõe para promover o redirecionamento de uma execução fiscal em face da pessoa do sócio-gerente (1) no caso de ter havido o encerramento das atividades da empresa. Importante anotar que o fechamento da empresa, sem que tenham sido pagas todas as suas obrigações fiscais (2), é o suficiente para fazer incidir a regra de responsabilização contida no artigo 135, III do Código Tributário Nacional (3).
Eis o entendimento há muito pacificado no Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. COMPROVADA DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA. REDIRECIONAMENTO. RESPONSABILIDADE. SÓCIO-GERENTE. ART. 135, III, DO CTN. RETORNO DOS AUTOS.
1. Não é omisso o aresto que examina exaustivamente os documentos constantes dos autos e decide de forma fundamentada, apesar de contrária à pretensão do recorrente. Inexistência de violação do artigo 535, II, do Código de Processo Civil.
2. Quando a sociedade se extingue irregularmente, como no caso, cabe responsabilizar o sócio-gerente, permitindo-se o redirecionamento. Assim, é dele o ônus de provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. Precedentes.
3. Estabelecida a possibilidade de redirecionamento do feito, os autos devem retornar ao Tribunal a quo para que sejam apreciadas as demais questões suscitadas nas apelações interpostas perante aquela Corte.
4. Recurso especial provido.(REsp 1091301/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2009, DJe 11/11/2009)
Superada esta questão, cabe frisar que a única hipótese de prescrição intercorrente (4) hoje positivada em nosso ordenamento é aquela prevista no parágrafo 4º do artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais. (5)
Tal instituto visa a coibir que o processo fique indefinidamente arquivado à espera de alguma providência do credor. Decorrido o prazo prescricional (contado da decisão que ordenou o arquivamento) sem a localização do devedor ou de bens passíveis de penhora, o processo deverá ser extinto com julgamento de mérito.
Pois bem.
Neste ponto destaca-se o entendimento de alguns, segundo o qual seria aplicável o prazo prescricional intercorrente de cinco anos para o redirecionamento da ação em relação aos sócios-gerentes, no caso de ter havido dissolução irregular da empresa. E referido prazo seria contado a partir da ordem para citação da empresa. Assim, a Fazenda teria cinco anos, contados da ordem de citação da empresa, para promover o redirecionamento e a responsabilização dos sócios-gerentes.
Referido entendimento teria fundamento no artigo 174 do Código Tributário Nacional (6), combinado com o disposto na recente Súmula Vinculante 08 do Supremo Tribunal Federal, que expressamente fixou o prazo de cinco anos para a cobrança judicial das Fazendas. Porém, em sendo constatada a dissolução irregular da empresa, e mesmo se admitindo outra hipótese de prescrição intercorrente que não a do artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais, não parece ser aquele o melhor entendimento.
Como sabido, o instituto da prescrição obriga o credor a ajuizar, a distribuir, a ação de cobrança do crédito no prazo de cinco anos (7), contados da sua constituição definitiva. Diz, pois, com a inércia do titular da ação. “Dizer que a ação para cobrança do credito tributário prescreve em cinco anos significa dizer que a Fazenda Pública tem o prazo de cinco anos para cobrar judicialmente, para propor a execução do credito tributário.” (8)
Ou seja, a credora tem um lustro para cobrar a dívida em juízo, inicialmente da empresa devedora.
Se, porém, no curso do processo, ficar constatado o fechamento de suas portas, o prazo prescricional para o redirecionamento, caso o admitamos, não pode ter como termo inicial o “cite-se” proferido logo após a distribuição da ação, até porque não raras vezes somente se constata nos autos a dissolução irregular após o sexto ano do ajuizamento (ou mais). Além disso, a credora só passou a ter interesse em ver o sócio-gerente no pólo passivo quando obteve a notícia da dissolução irregular, a qual geralmente se dá por meio de certidão do oficial de justiça, após diligências in loco). Não antes.
Em outras palavras, até a data em que se teve notícia formal do encerramento irregular das atividades da empresa, os sócios sequer poderiam integrar o pólo passivo da demanda, exatamente em razão de serem distintas as personalidades jurídicas da sociedade e dos sócios.
Assim, não poderia ter início a contagem de prazo prescricional. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou a respeito:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. CITAÇÃO DA EMPRESA E DO SÓCIO-GERENTE. PRAZO SUPERIOR A CINCO ANOS. PRESCRIÇÃO. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA.
1. O Tribunal de origem reconheceu, in casu, que a Fazenda Pública sempre promoveu regularmente o andamento do feito e que somente após seis anos da citação da empresa se consolidou a pretensão do redirecionamento, daí reiniciando o prazo prescricional.
2. A prescrição é medida que pune a negligência ou inércia do titular de pretensão não exercida, quando o poderia ser.
3. A citação do sócio-gerente foi realizada após o transcurso de prazo superior a cinco anos, contados da citação da empresa. Não houve prescrição, contudo, porque se trata de responsabilidade subsidiária, de modo que o redirecionamento só se tornou possível a partir do momento em que o juízo de origem se convenceu da inexistência de patrimônio da pessoa jurídica. Aplicação do princípio da actio nata.
4. Agravo Regimental provido. (AgRg no REsp 1062571/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe 24/03/2009).
Portanto, na hipótese de se admitir a prescrição intercorrente no caso de redirecionamento da execução fiscal, seu termo inicial deverá ser a data da ciência do credor sobre o encerramento irregular das atividades da empresa executada.
Referência
1. Aquele que tem poder de administração.
2. Chamada “dissolução irregular”.
3. Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
4. Que se dá no curso do processo.
5. Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. parágrafo 4 Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051, de 2004)
6. Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)7. 30 anos para cobrança do FGTS.8. Hugo de Brito Machado, in Curso de Direito tributário, 22ª edição, ed. Malheiros, pág. 195.