segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Exigibilidade do crédito tributário é julgada no STJ

Com base no artigo 151, inciso VI, do Código Tributário Nacional, é obrigatória a homologação expressa do pedido requerido ao programa de parcelamento fiscal (Paes) a fim de que seja suspensa a exigibilidade do crédito tributário. O entendimento é da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de Recurso Especial do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). A 1ª Seção utilizou o rito da Lei do Recursos Repetitivos para julgar o processo.
O INSS recorreu da decisão desfavorável do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Na ação, sustenta que ao manter a extinção da execução fiscal referente a crédito tributário objeto de pedido de parcelamento fiscal, somente homologado após a propositura do feito executivo, o TJ violou a Instrução Normativa INSS/DC 91/2003, e as Leis 10.684/2004 e 10.522/2002.
Ao decidir, o relator, ministro Luiz Fux, destacou que o parcelamento fiscal, concedido na forma e condição estabelecidas em lei específica, é causa suspensiva da exigibilidade do crédito tributário.
Assim, a produção de efeitos suspensivos da exigibilidade do crédito tributário, advindos do parcelamento, condiciona-se à homologação expressa ou tácita do pedido formulado pelo contribuinte junto ao Fisco.
O ministro ressaltou, ainda, que à época do ajuizamento da demanda executiva, inexistia homologação expressa ou tácita do pedido de parcelamento protocolizado, razão pela qual merece reparo a decisão que extinguiu o feito com base no Código Processual Civil. Para ele, a suspensão da exigibilidade do crédito tributário, após a propositura da ação, tem o condão somente de obstar o curso do feito executivo e não de extingui-lo. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
Resp 957.509

quarta-feira, 26 de maio de 2010

A FAMÍLIA SOLIDÁRIA E SEU RECONHECIMENTO NO ORDENAMENTO PÁTRIO.

Elaborado por Anthony Gonçalves. Sócio do Escritório Gonçalves Consultores e Advogados Associados. Parecerista e advogado no Rio de Janeiro.
Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela FGV
O presente texto não possui o escopo de esgotar e analisar por completo toda a complexidade do tema proposto, em verdade, este se traduz na tentativa de demonstrar perante o ordenamento jurídico pátrio, a validade e amplitude da família eudemonista constitucionalmente consagrada.

A vanguarda do tema acaba por provocar certas dificuldades conceituais doutrinárias, em virtude da ausência de fontes nacionais de consulta, o que impõe a realização de profundas análises das idéias alienígenas já sedimentadas, incorporando-as por meio da exegese analógica.


Concepção de Família no Direito Pátrio Atual


A etimologia da palavra família nos transporta ao latim, advinda de famel que significava escravo, doméstico, indicando no sentido restrito a sociedade matrimonial.

Na concepção histórica a família não possuía os mesmos elementos da atualidade, já que os indivíduos se reuniam em torno do patriarca submetendo-se a todos os seus comandos e ordens, presenciando a existência de verdadeiro “déspota familiar”.

Entre os romanos, além desta reunião de pessoas submetidas ao poder de um cidadão independente (homo sui iuris), era a família, também sinônimo de patrimônio, compreendendo todos os bens pertencentes aos seus integrantes de maneira indivisível. Por este motivo vimos à existência da actio familiae erciscundae, com o escopo de se dividir a herança.

Com o advento do Novo Código Civil, foram revogados todos os dispositivos que se referiam ao poder patriarcal, inserindo o novel diploma o chamado poder familiar que de acordo com o artigo 1.631 é exercido por ambos os consortes, inclusive quando não unidos pelo laço do matrimonio, sendo aplicável esta disposição nos casos de união estável.

Mesmo com a existência da Lei n° 4.121/62, foi a revogação do Código de 1916 que equalizou a Lei Civil aos comandos já emanados da Constituição da República, extirpando a concepção romana da submissão da mulher, propter sexus infirmatatem et ignoratiam rerum forensium.

Na atualidade, esvaziou-se por completo o conteúdo econômico e patrimonial da família, representando a reunião de pessoas por consanguinidade, afinidade, afetividade, parentesco ou solidariedade, com escopo mútuo de promover o desenvolvimento de cada um de seus integrantes, representada pela busca incessante da felicidade de todos os membros da coletividade familiar.

Este fenômeno é doutrinariamente chamado de família eudemonista, onde o afeto familiar assume vital papel, é elemento caracterizador da união do núcleo familiar. Sergio Resende de Barros ensina que “este é o afeto que define a família: é o afeto conjugal. Mais conveniente será chamá-lo de afeto familiar, uma vez que está arraigada nas línguas neolatinas a significação que, desde o latim, restringe o termo cônjuge no binômio marido e mulher, impedindo e desaconselhando entendê-lo para além disso.[1]
Tal fenômeno evolucionista fora magistralmente definido pela Ministra Nancy Andrighi do Superior Tribunal de Justiça, interligando a este o princípio basilar do ordenamento jurídico pátrio, quando asseverou: “tendo em perspectiva a transformação estrutural por que passa a família, que hoje apresenta molde eudemonista, cujo alvo é a promoção de cada um de seus componentes, em especial da prole, com o insigne propósito instrumental de torná-los aptos de realizar os atributos de sua personalidade e afirmar a sua dignidade como pessoa humana.[2]

Rompe-se, portanto, com a definição tradicional da base do Estado, arraigando a novel concepção não só aos integrantes, mas também a estruturação do Estado lato sensu, possibilitando cada vez mais a existência de núcleos familiares dispares aos tradicionalmente concebidos, desde que aptos a persecução dos objetivos modernamente definidos.


A Família Solidária


Com apego as características modernas da família, podemos conceitualizar o surgimento de uma nova entidade familiar que embora ainda não admitida pelos tribunais pátrios, traduz-se em ocorrência factual na sociedade.

A família solidária é aquela composta por pessoas totalmente desprovidas de consanguinidade, parentesco ou qualquer outro laço de afeto sexual, são indivíduos que se reuniram como família para o auxílio mútuo, com o escopo eudemonista, conforme bem salientou Ana Carla Harmatiuk Matos: “Trata-se daquelas realidades de convívio com esforço mútuo para manutenção de pessoas que têm em comum a necessidade premente de auxiliar-se”[3].

Possível se destacar como exemplos as uniões de idosos, amigos, portadores de necessidades especiais dentre inúmeras outras.

Porém, um fato deve ser suscitado pelo jurista. Como conferir legitimidade familiar a uma reunião de pessoas pura e simples, de maneira tácita como ocorre com a união estável? Será necessária uma declaração de vontades?

Em nosso sentir, a resposta será positiva.

A declaração de vontades deverá ser realizada de maneira induvidosa, já que o reconhecimento desta união como entidade familiar gerará aos indivíduos que a compõe uma série de obrigações sinalagmáticas.

Neste prisma, a experiência estrangeira poderá nos brindar com a solução deste impasse, a qual, por obviedade deverá ser adaptada as necessidades do ordenamento pátrio.

Advém como possível solução o pacte civil de solidarité instituído pela República da França através da Lei n° 99-944 de 15 de Novembro de 1999, publicada em 16 de Novembro de 1999, e pelos Decretos de 21 de Dezembro de 1999 n°99-1089 e n° 99-1091, publicados em 24 de Dezembro de 1999. Estes textos completaram nomeadamente o Livro I°, título XII, capítulo I e II do Código Civil.

O pacto civil de solidariedade, conhecido por PACS é um contrato de direito de familia, com o escopo de organizar a vida em comum, criando uma nova modalidade de familia.

O Artigo 1° da Lei 99-944 alterou o artigo 515 do Code Civil des Français, indicando a possibilidade de duas pessoas maiores do mesmo sexo ou de sexos diferentes organizarem suas vidas em comum, reconhecendo aquela união como entidade familiar para todos os efeitos legais.

Não estamos a propor a adoção plena da solução francesa, esta apenas serviria como “pano de fundo”, conferindo dentro do ordenamento jurídico pátrio a solução e segurança jurídica para as pessoas que vivem nestas modalidades de família.

Assim, seria possível a satisfação da dignidade da pessoa humana, criando a obrigação de assistência mútua, solidariedade entre os contratantes pelas dívidas com despesas assumidas em prol da sociedade, dentre uma pluralidade de inovações que se traduzem de extrema justiça, já que existente equiparação constitucional entre todos os tipos familiares.

Com esteio neste entendimento, será possível, v.g. o reconhecimento de uma família composta por amigos, assim como já ocorre com a família anaparental, cujo diferencial será puramente o vínculo de sangue, já que não se faz imperiosa a existência de um “chefe” para que se caracterize o núcleo familiar.

Esta família solidária estará revestida de todas as benesses legais conferidas as demais, tais como a possibilidade de adoção[4] e o pensionamento.

Por mais astuta e vanguardista que pareça esta afirmação, deverá o exegeta possuir como norte o escopo social constitucional existente no núcleo familiar.


Conclusão


Superando as barreiras ortodoxas do fundamentalismo dogmático empregado na análise das novas entidades familiares, mister se elevar a relevância fática sob o prisma personalista e constitucional do Direito de Família.

O direito nasceu como obra humana a servir o homem, devendo por obviedade adaptar-se aos elementos fáticos sociais como ciência viva que é.

Não se pode considerar aceitável a existência de cidadãos excluídos da proteção Estatal do Direito de Família. Tal ocorrência fere de morte os Direitos Fundamentais, abrindo prerrogativa maior a já existente crise da família[5], organismo vital para existência do Estado.

Assim, esta arredia omissão protetiva estatal sobre as novas entidades familiares, poderá acarretar grave risco ao próprio Estado, devendo o operador do Direito atentar a esta ocorrência.
[1] BARROS, Sergio Resende de, A ideologia do afeto, Revista Brasileira de Direito de Família n° 14 (jul.-set./2002), Porto Alegre: Síntese/IBDFAM, p. 8.
[2] BRASIL – Superior Tribunal de Justiça – Recurso Especial n° 1.008.398/SP – DJe 18/11/2009.
[3] VI Congresso Brasileiro de Direito de Família, Belo Horizonte, 14 a 17 de novembro de 2007.
[4] Como referência podemos utilizar o entendimento aplicável às uniões homoafetivas, verbis:
MENORES. ADOÇÃO. UNIÃO HOMOAFETIVA.
Cuida-se da possibilidade de pessoa que mantém união homoafetiva adotar duas crianças (irmãos biológicos) já perfilhadas por sua companheira. É certo que o art. 1º da Lei n. 12.010/2009 e o art. 43 do ECA deixam claro que todas as crianças e adolescentes têm a garantia do direito à convivência familiar e que a adoção fundada em motivos legítimos pode ser deferida somente quando presentes reais vantagens a eles. Anote-se, então, ser imprescindível, na adoção, a prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque se discute o próprio direito de filiação, com consequências que se estendem por toda a vida. Decorre daí que, também no campo da adoção na união homoafetiva, a qual, como realidade fenomênica, o Judiciário não pode desprezar, há que se verificar qual a melhor solução a privilegiar a proteção aos direitos da criança. Frise-se inexistir aqui expressa previsão legal a permitir também a inclusão, como adotante, do nome da companheira de igual sexo nos registros de nascimento das crianças, o que já é aceito em vários países, tais como a Inglaterra, País de Gales, Países Baixos, e em algumas províncias da Espanha, lacuna que não se mostra como óbice à proteção proporcionada pelo Estado aos direitos dos infantes. Contudo, estudos científicos de respeitadas instituições (a Academia Americana de Pediatria e as universidades de Virgínia e Valência) apontam não haver qualquer inconveniente na adoção por companheiros em união homoafetiva, pois o que realmente importa é a qualidade do vínculo e do afeto presente no meio familiar que ligam as crianças a seus cuidadores. Na específica hipótese, há consistente relatório social lavrado por assistente social favorável à adoção e conclusivo da estabilidade da família, pois é incontroverso existirem fortes vínculos afetivos entre a requerente e as crianças. Assim, impõe-se deferir a adoção lastreada nos estudos científicos que afastam a possibilidade de prejuízo de qualquer natureza às crianças, visto que criadas com amor, quanto mais se verificado cuidar de situação fática consolidada, de dupla maternidade desde os nascimentos, e se ambas as companheiras são responsáveis pela criação e educação dos menores, a elas competindo, solidariamente, a responsabilidade. Mediante o deferimento da adoção, ficam consolidados os direitos relativos a alimentos, sucessão, convívio com a requerente em caso de separação ou falecimento da companheira e a inclusão dos menores em convênios de saúde, no ensino básico e superior, em razão da qualificação da requerente, professora universitária. Frise-se, por último, que, segundo estatística do CNJ, ao consultar-se o Cadastro Nacional de Adoção, poucos são os casos de perfiliação de dois irmãos biológicos, pois há preferência por adotar apenas uma criança. Assim, por qualquer ângulo que se analise a questão, chega-se à conclusão de que, na hipótese, a adoção proporciona mais do que vantagens aos menores (art. 43 do ECA) e seu indeferimento resultaria verdadeiro prejuízo a eles. (grifei)
BRASIL, Superior Tribunal de Justiça – Recurso Especial n° 889.852/RS - Rel. Min. Luis Felipe Salomão - Julgado em 27.04.2010.
[5] MAZEAUD, Mazeaud et, Leçons de Droit Civil, vol. I, n° 685.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Detran não pode exigir vistoria em licenciamento

O licenciamento de automóveis no Rio de Janeiro não depende de vistoria do Detran. Pelo menos não para o advogado João Pedro Campos de Andrade Figueira, que conseguiu uma liminar, na quarta-feira (28/4), para poder licenciar seu carro. Para a Justiça do estado, só a União pode legislar sobre trânsito, o que torna ilegais as normas estaduais que condicionaram o licenciamento à vistoria.
A decisão foi tomada pela juíza Neusa Alvarenga Leite, da 14ª Vara da Fazenda Pública da capital. “Os atos administrativos não podem ampliar matérias que não estejam disciplinadas em Lei, sob pena de burlar o comando constitucional”, disse ela na liminar. “Não se pode permitir que toda documentação referente a um automóvel somente seja deferida após a vistoria.” O Mandado de Segurança foi ajuizado pelo advogado Leandro Mello Frota.
Em 1998, o Conselho Nacional de Trânsito editou a Resolução 84/1998, que disciplinava a necessidade de vistoria para o licenciamento anual obrigatório. Um ano depois, no entanto, a exigência caiu, depois que o órgão publicou a Resolução 107/1999. Desde então, não há norma federal que obrigue os proprietários a submeter os veículos ao Detran antes de licenciá-los. “Compete exclusivamente à União legislar sobre trânsito, o que fez com a edição do Código de Trânsito”, disse a juíza.
Segundo ela, a obrigação de se fazer vistoria é uma forma de o estado exigir a quitação de multas e tributos, “manobra que objetiva criar receita sem a propositura da ação executiva própria”. A obrigação, no caso, não teria propósito de fiscalização dos automóveis, e sim de arrecadar.
“Se um carro é vendido duas vezes em um ano, fará duas vistorias para transferência de propriedade, o que demonstra que o objetivo da exigência não é a inspeção de segurança”, lembrou a juíza. Ela determinou que o Detran fluminense licenciasse o automóvel em 2010 sem que a vistoria fosse feita.
Leia a liminar:
Trata-se de demanda em que o impetrante objetiva o licenciamento do veículo sem a realização da vistoria. Conforme se constata da Constituição da República em seu artigo 20, XI, compete exclusivamente à União legislar sobre trânsito, o que fez com a edição do Código de Trânsito. Desta forma, para melhor desempenho e organização estabeleceu-se que o CONTRAN regulamentaria algumas situações, dentro elas o sistema de licenciamento.
Ocorre que a Resolução nº 84/1998 do CONTRAN que estabelecia a vistoria como exigência obrigatória para o licenciamento do automóvel, foi suspensa pela Resolução nº 107/99 impedindo a sua aplicação desde esta data. Frise-se que o Código de Trânsito não exige a vistoria, o que impede a edição de Resoluções e Portarias como forma de restringir direito.
Os atos administrativos não podem ampliar matérias que não estejam disciplinadas em Lei, sob pena de burlar o comando constitucional. No Estado do Rio de Janeiro, em regra, são as Portarias e Resoluções que disciplinam todas as controvérsias referentes à regularização dos veículos, procedimento inadequado e que atinge o usuário do serviço. Ressalte-se que a exigência da autarquia possui interesse duplo, pois ao exigir a vistoria, por via transversa, impõe o adimplemeneto de todas as multas e tributos relacionados ao bem, manobra que objetiva criar receita sem a propositura da ação executiva própria. Conforme se verifica no sistema atual, todos os procedimentos referentes à regularização de automóvel geram a vistoria com o pagamento do respectivo DUDA.
Se um carro é vendido duas vezes em um ano, fará duas vistorias para transferência de propriedade, o que demonstra que o objetivo da exigência não é a inspeção de segurança. Por outro lado, desde que legitimamente autorizado, o DETRAN pode realizar a inspeção de segurança dos carros, no entanto, não se pode permitir que toda documentação referente a um automóvel somente seja deferida após a vistoria. Os atos administrativos devem observar o princípio da razoabilidade, sob pena de ultrapassar os limites da isonomia também exigida pela Constituição.
Em face do exposto, DEFIRO A LIMINAR para determinar o licenciamento anual de 2010 do veículo conforme documento de fls. 15/16, sem a exigência de vistoria. Certificado o correto recolhimento das custas, intimem-se. Notifique-se a autoridade coatora. Intime-se para apresentar impugnação. Decorrido o prazo legal, com ou sem manifestação, ao Ministério Público. P.I.
Processo 0130323-42.2010.8.19.0001

Lei de Recursos Repetitivos pode se tornar obsoleta

A Lei de Recursos Repetitivos (Lei 11.672/08), que começou a vigorar em agosto de 2008 e logo conquistou a simpatia dos principais processualistas do Superior Tribunal de Justiça, porque elimina a grande quantidade de recursos idênticos, está prestes a se tornar obsoleta. O novo Código de Processo Civil deve instituir o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, levando para o segundo grau de jurisdição a tarefa de impedir que as demandas repetidas cheguem ao STJ. O incidente também deverá refrear os Recursos Extraordinários, desafogando o Supremo Tribunal Federal.
O consultor do Senado, Bruno Dantas, que integra a comissão de 12 juristas encarregados de elaborar o anteprojeto do CPC, explica que o novo incidente “será muito mais amplo” do que os recursos repetitivos, porque “vai inibir as ações repetitivas” e não apenas os recursos. Em entrevista à Consultor Jurídico, Bruno Dantas informou que o incidente será decidido no TJ ou TRF, vinculando as decisões dos juízes de primeiro grau.
“Sempre que houver uma demanda com potencial de se multiplicar, o juiz vai suscitar o tribunal e este vai decidir a tese jurídica que os juízes de todo o estado ou região vão aplicar no caso concreto, naturalmente exercendo seu papel de analisar provas e demais atos processuais”, explicou. Segundo ele, para cada tipo de demanda haverá, no máximo, 27 recursos ao STF ou STJ, um de cada decisão estadual. E a decisão superior também vai gerar uma tese jurídica vinculante para todo o país.
A Comissão que elaborou o novo CPC vai continuar ativa, por decisão do presidente do Congresso Nacional, senador José Sarney (PMDB-AP). Os juristas vão acompanhar a tramitação do processo e auxiliar os parlamentares até a aprovação da lei que criará o novo CPC. De acordo com Bruno Dantas, ao estender o prazo de entrega do anteprojeto para o dia 8 de junho, o senador José Sarney reconheceu a importância da Comissão e acabou dando um prazo “importante para que os juristas façam uma boa revisão do texto, eliminando eventuais incompatibilidades, já que o trabalho foi exatamente sanar as incongruências de 36 anos de reformas das leis processuais”, disse.
Bruno Dantas, 32 anos é baiano de Salvador. Mestre e doutorando em Direito Processual Civil (PUC-SP), é consultor-geral do Senado desde 2007. É conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público e integra o Comitê de Gestão do II Pacto Republicano. Professor dos cursos de pós-graduação e extensão da PUC-SP, do Instituto Brasiliense de Direito Público e da Escola Superior da Advocacia do DF. Autor de diversos artigos científicos e do livro “Repercussão geral: perspectivas histórica, dogmática e de direito comparado – questões processuais”.
Leia a entrevista
ConJur — Quais novidades o senhor destaca no anteprojeto do CPC?Bruno Dantas — Uma das novidades é a criação da parte geral, aquele livro do Código que tem aplicação em todos os demais. Hoje, o CPC tem um livro de processo de conhecimento, um de recursos e um de procedimentos especiais. Os artigos sobre honorários advocatícios estão no processo de conhecimento e daí surge a pergunta: tem honorários advocatícios em recurso, tem honorários advocatícios no cumprimento da sentença? O mesmo em relação à multa por litigância de má-fé. Há coisas que estão no processo de conhecimento e entende-se que são aplicáveis só a esse processo. A partir da constatação de que podemos facilitar a vida daqueles que vão a juízo discutir uma questão importante quanto ao direito material, vimos que precisamos dotar os operadores do direito de mecanismos claros para estabelecer os caminhos que terão de trilhar até a sentença de mérito. Essa percepção fez com que trouxéssemos, por exemplo, a tutela de urgência para dentro da parte geral, eliminando o livro de processo cautelar. E a partir da antecipação de tutela que está hoje no processo de conhecimento, trouxemos tudo para a parte geral e chamamos de tutela de urgência.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Exceção de pré-executividade pode ser utilizada para reconhecer prescrição de título

É possível a utilização de exceção de pré-executividade para se reconhecer a prescrição de título executivo, desde que não demande dilação probatória. Com base nessa recente jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, a Quarta Turma do STJ determinou que o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro reaprecie uma ação de execução movida pelo Banco Mercantil do Brasil S/A contra a empresa Peixe S/A.
Em exceção de pré-executividade, a Peixe argumentou que, além de ser meramente avalista do título, a ação cambial prescreve em três anos, a contar do seu vencimento. Alegou ainda que a referida nota promissória foi emitida em 28 de janeiro de 1994, com vencimento para 30 dias, e que, por inércia do banco, a empresa só foi citada em 27 de julho de 2000. O Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Rio de Janeiro rejeitou o recurso por entender que a exceção de pré-executividade não é o meio idôneo para se discutir prescrição de título executivo. A empresa recorreu ao STJ, apontando divergência jurisprudencial quanto à possibilidade de sua utilização.
Segundo o relator, ministro Aldir Passarinho Junior, a gama de matérias que podem ser levantadas por meio da exceção tem sido ampliada por força da interpretação jurisprudencial mais recente que admite a arguição de prescrição do título, desde que não demande dilação probatória.
“Assim, tem-se que a exceção de pré-executividade constitui instrumento de que dispõe o executado sempre que pretenda infirmar a certeza, a liquidez ou a exigibilidade do título através de inequívoca prova documental, e cuja propositura independe de prévia segurança do juízo”, ressaltou em seu voto.
Até então, a doutrina só admitia a utilização da exceção de pré-executividade em relação às matérias de ordem pública envolvendo questão de viabilidade da execução – liquidez e exigibilidade do título, condições de ação e pressupostos processuais.
Para o ministro, no caso em questão o tribunal rejeitou a utilização da exceção para o reconhecimento da prescrição sem sequer adentrar no exame de eventual necessidade de dilação probatória. Assim, por unanimidade, a Turma acolheu o recurso e determinou o retorno dos autos à instância ordinária para que a exceção de pré-executividade seja apreciada.

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Ação anulatória não precisa de depósito

Por Kenedy Oliveira Vilela

A ação anulatória de débito fiscal, conforme ensina Cleide Previtalli Cais “pode ser promovida pelo contribuinte contra o Poder Público tendo como pressuposto a preexistência de um lançamento fiscal, cuja anulação se pretende pela procedência da ação, desconstituindo-o”
Ela é cabível antes, durante e no curso da execução fiscal. Na pendência desta – já realçou – não induz litispendência e, supervenientemente à extinção do processo executivo, não afronta a autoridade da coisa julgada.
Questão interessante, é saber se é possível ingressar com ação anulatória de débito após a propositura da ação executiva fiscal? Particularmente, entendemos que sim.
E após o transcurso do prazo para apresentação dos embargos à execução?
Inicialmente, cumpre destacar que a perda do prazo para opor embargos não induz a preclusão na ação anulatória.
Parte da doutrina entende que após o lapso temporal de 30 dias, contados da intimação da penhora, opera a preclusão, também, para a ação anulatória.
Partindo do pressuposto que o prazo para opor embargos à execução é um fenômeno interno do processo executivo, os efeitos de sua preclusão não podem irradiar sobre outras ações previstas na legislação, notadamente na ação anulatória.
Acerca do tema, Carlos Erminio Allievi em oportuno estudo, assim consigna:
“CHIOVENDA, há muito afirmou que a preclusão ‘opera esclusivamente nell’interno Del processo, nel quale essa si verifica’.
Os embargos à execução não são o único instrumento processual adequado para discutir a dívida ativa da fazenda pública, aliás, o próprio artigo 38 da Lei de Responsabilidade Fiscal, isto estabelece. Portanto, o devedor tem o direito de optar pela ação que melhor atender suas necessidades. Ao executado é dado o direito de escolha. Não há uma obrigação de optar-se por esta ou aquela ação, mas uma faculdade.
Admitir-se que a preclusão, nos embargos à execução, atinge outros tipos de ações, hábeis para discutir a dívida é o mesmo que endossar,a contrário sensu, a impossibilidade da discussão da matéria em sede de embargos à execução, nos casos em que o contribuinte, v.g., não fez uso do mandado de segurança dentro do prazo decadencial de 120 dias.
THEDORO JÚNIOR, concluiu seu posicionamento acerca deste tema, nestes termos:
Em suma: ‘em razão de execução injusta e não embargada, ao executado está facultada a possibilidade de propor demanda cognitiva autônoma, visando à obtenção de provimento jurisdicional declaratório ou desconstitutivo do título executivo’ ...
Em outras palavras: ‘Não há uma obrigação do executado de oferecer embargos, mas apenas um faculdade.
A ação anulatória é instrumento processual apto e adequado para o reconhecimento dos direitos do cidadão, tenha ou não decorrido o prazo legal para embargos. Impedir sua utilização, com base em preclusão em outra ação, é excluir a tutela. E, sem ela, não há direito.
GIUSEPPINO TREVES, também pensa assim: Se falta (aos direitos do homem) o seu reconhecimento (do ordenamento jurídico) ou se este é puramente verbal e não é acompanhado de uma tutela efetiva, não têm atrás de si a força do ordenamento jurídico. Se não há remédio, não há direito.”
E qual o seu prazo prescricional? A presente pergunta tem duas respostas.
Os artigos 168 e 169 do Código Tributário devem ser interpretados em conjunto e disso resultam que:
1 - o prazo para pleitear administrativa ou judicialmente a restituição é decadencial e exaure-se depois de cinco anos, contados nos termos dos incisos I e II do artigo 168;
2 - o prazo prescricional de dois anos referido no artigo 169 só tem cabimento quando o contribuinte pleitear administrativamente a restituição e esta lhe for contrária, contando-se, neste caso, o prazo da data em que se tornar definitiva a decisão administrativa.
E qual é a relação entre a ação anulatória de débito e a ação executiva fiscal?
Sobre a presente questão, Júlio M. de Oliveira, preleciona, preliminarmente, que doutrina e parte da jurisprudência, admite haver conexão entre o processo executivo fiscal (lato senso, incluídos a execução e os embargos à execução) e a ação anulatória e não se aperfeiçoa o fenômeno da litispendência.
Citando James Marins, este assim consigna:
“o que há de comum entre a execução e a ação anulatória do débito fiscal e que deve induzir a conexão com a reunião das causas é justamente a causa de pedir remota (ou razão mediata do pedido), isto é, no primeiro caso, o lançamento como fundamento do título executivo (causa de pedir remota para a excutição dos bens do contribuinte devedor) e, no segundo caso, o próprio lançamento tido como viciado, agora como causa de pedir remota do pedido anulatório. Por sua afinidade devem os processos (embargos de execução fiscal e anulatória) ser reunidos evitando-se a possibilidade de julgamentos contraditórios.”
A conexão com o executivo fiscal restará implementada, nos casos de ação anulatória sem efetivação de depósito judicial, quando o executado se contrapor à pretensão fazendária, seja pelos embargos à execução ou pela exceção de pré-executividade.
O que justifica a conexão entre as ações, além do atendimento aos comandos normativos processuais, é a garantia do sobrevalor da segurança jurídica, que estaria sobremaneira atingida com a construção de normas individuais e concretas contraditórias, emitidas por juízos igualmente competentes. O que se busca é a resolução da lide tributária de maneira uniforme, de tal modo a que se decida ou pela constituição ou pela desconstituição do tributo., e, também, por medida de economia processual.
Neste sentido, perfilha a jurisprudência, senão vejamos:
“PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL E AÇÃO ANULATÓRIA DO DÉBITO. CONEXÃO. JULGAMENTO CONJUNTO. IMPOSIÇÃO. COMPETÊNCIA FIRMADA POR NORMAS DE ORGANIZAÇÃO JUDICIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE AO SIMULTANEUS PROCESSUS.
1. Patente a conexão entre as ações anulatória e executiva, impõe-se o julgamento conjunto de ambas as ações, tanto por medida de economia processual quanto por motivo de segurança jurídica, evitando-se assim desgaste processual desnecessário e decisões judiciais conflitantes. Precedentes.
2. Se por um lado é certo que a conexão ou a continência, por si sós, não têm o condão de modificar a competência atribuída pelas normas de organizações judiciárias, por tratar-se de competência absoluta; por outro, impossível não reconhecer, até mesmo por questão de bom senso, que a ação anulatória e a de execução fiscal referentes ao mesmo débito devem ser apreciadas pelo mesmo juízo, na medida em que o resultado de uma terá influência direta sobre o da outra.
(...)” (STJ, RESP 200301465932, Primeira Turma, Relator Ministro José Delgado, DJ19/04/2004, pág. 001650)
Com relação à continência, é possível a reunião dos processos, deste que concomitantes, e com o fito de se evitar decisões judiciais contraditórias. Neste sentido, é oportuno trazer à colação jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça, a ver:
“Processual Civil. Ação Anulatória de Débito Fiscal. Execução Fiscal. Conexão. Continência. Reunião dos Processos. CPC, artigos 102, 103, 105, 106 e 585, § 1º. Lei 6.830/80 artigo 38. Súmula 112/STJ.
1. Concomitantes as ações anulatórias e de execução fiscal, seja à força da conexão ou da continência, devem ser reunidas para apreciação simultânea, evitando-se composições judiciais contraditórias. A direção única do processo é via favorecedora.
2. Precedentes jurisprudenciais.
3. Recurso provido.” (destaque não originais)
(STJ, RESP 200000981940, Primeira Turma, Relator Ministro Milton Luiz Pereira, DJ 18/11/2002, pág. 00159, RTFP vol. 00050, pág. 00326)
“CONFLITO DE COMPETÊNCIA. EMBARGOS À EXECUÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL, EM EXECUÇÃO FISCAL. OCORRÊNCIA DA CONTINÊNCIA ENTRE AS AÇÕES.
1. Objetos da ação anulatória de débito fiscal e da execução fiscal e respectivos embargos que se referem ao recolhimento do seguro de acidente de trabalho (SAT), variando, apenas, na sua amplitude, havendo, porém, identidade de partes e causa de pedir. Ocorrência do instituto da continência.
2. Precedentes da 1ª Seção desta Corte Superior.
3. Conflito conhecido para se declarar competente o Juízo Federal da 7ª Vara da Seção Judiciária do Estado do Rio de Janeiro, o Suscitado.” (grifo e destaque não originais)
(STJ, CC 199800542736, Primeira Seção, Relator Ministro José Delgado, DJ 29/03/1999, pág. 00064)
Quanto à exceção de pré-executividade, algumas perguntas são relevantes: (a) em que consiste a exceção de pré-executividade? (b) qual seu fundamento legal? (c) quem pode oferece-la? Qual o momento adequado para sua apresentação? (d) quais matérias são passíveis de argüição? A interposição de exceção de pré-executividade tem o condão de suspender o trâmite do processo de execução?
(a) A exceção de pré-executividade é instituto jurídico novo. Surgiu para suavizar a rigidez da lei processual civil e permitir que o executado promova sua defesa diretamente no processo de execução, não havendo necessidade de garantia do juízo, requisito obrigatório para o manejo dos embargos à execução/devedor.
Vale ressaltar que, devido sua sistematização e constância, a expressão “exceção” perdeu o sentido, e hodiernamente deveria se chamar “regra de pré-executividade”.
Consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (Primeira Seção), a exceção de pré-executividade é cabível quando atendidos simultaneamente dois requisitos, um de ordem material e outro de ordem formal, quais sejam: a) é indispensável que a matéria seja suscetível de conhecimento de ofício pelo juiz; e b) não demande dilação probatória. Senão vejamos:
“TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL SÓCIO-GERENTE CUJO NOME CONSTA DA CDA. PRESUNÇÃO DE RESPONSABILIDADE. ILEGITIMIDADE PASSIVA ARGUIDA EM EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. INVIABILIDADE. PRECEDENTES.
1. A exceção de pré-executividade é cabível quando atendidos simultaneamente dois requisitos, um de ordem material e outro de ordem formal, ou seja: (a) é indispensável que a matéria invocada seja suscetível de conhecimento de ofício pelo juiz; e (b) é indispensável que a decisão possa ser tomada sem necessidade de dilação probatória.
2. Conforme assentado em precedentes da Seção, inclusive sob o regime do artigo 543-C do CPC (REsp 1104900, Min. Denise Arruda, sessão de 25.03.09), não cabe exceção de pré-executividade em execução fiscal promovida contra sócio que figura como responsável na Certidão de Dívida Ativa - CDA. É que a presunção de legitimidade assegurada à CDA impõe ao executado que figura no título executivo o ônus de demonstrar a inexistência de sua responsabilidade tributária, demonstração essa que, por demandar prova, deve ser promovida no âmbito dos embargos à execução.
3. Recurso Especial provido. Acórdão sujeito ao regime do artigo 543-C do CPC.” (grifo e destaque não original)
(STJ, RESP 200900162098, Primeira Seção, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJE 04/05/2009)
A exceção de pré-executividade é um recurso de defesa, não antiexacional, que dispensa a segurança prévia do juízo, que não demanda dilação probatória e “restrito às questões concernentes aos pressupostos processuais, condições da ação e vícios objetivos do título, referentes à certeza, liquidez e exigibilidade” (STJ, REsp 232.76/PR, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. de 18-12-2001, DJU, 25 mar. 2002, p. 182, apud Odmir Fernandes ET AL., Lei de Execução Fiscal, cit., p. 302).(grifo e destaque não original)
Seguem outras definições, a ver:
“Como exemplo, Araken de Assis posiciona-se da seguinte forma:
Embora não haja qualquer previsão legal explícita, se o órgão judiciário, por
lapso, tolerar a falta de algum pressuposto, é possível o executado requerer seu exame, quiçá promovendo a extinção da demanda executória, a partir do lapso de vinte e quatro horas. Tal provocação de matéria passível de conhecimento de ofício pelo juiz prescinde a penhora, e, a fortiori, do oferecimento de embargos.
Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Andrade Nery dizem:
É o meio de defesa que prescinde da segurança do juízo para ser exercido, justamente porque versa sobre matérias de ordem pública, a respeito das quais o juiz deve pronunciar-se de ofício. Se a ação de execução não poderia ter sido proposta em virtude de, por exemplo, faltar eficácia executiva ao título, não se pode onerar o devedor com a segurança do juízo para poder se defender.
Não é outro o entendimento Clito Fornaciari Júnior:
A chamada exceção de pré-executividade nada mais é, do que a alegação de vícios que comprometem a execução e que deveriam ter sido constatados pelo juiz no nascedouro do processo, prescindindo de forma própria, de prazo e da segurança prévia do juízo com a realização da penhora. Bastaria, pois, uma simples petição antes da penhora ou depois desta, até quando se perdeu o prazo para os embargos de devedor.
Danilo Knijnik, sustenta a exceção de pré-executividade, que deve ser acolhida toda vez em que em que falte requisitos de admissibilidade da execução. Assim leciona o autor:
A exceção de pré-executividade é fruto do labor teórico processual e representa, apenas, uma revelação parcial de um fenômeno bem mais amplo: uma revelação do officum iudicis. Ela atende, apenas à admissibilidade da execução e não pode ser utilizada para controlar ocorrências processuais internas, próprias da fenomenologia do executivo.
No mesmo sentido é a posição de Anita Flávia Hinijosa: “exceção de pré executividade é o meio de defesa do devedor através do qual lhe é possibilitado apontar ao juízo matérias que, embora sejam de ordem privada e de seu exclusivo interesse, fulminam a pretensão executiva, impedindo seu prosseguimento .”
(b) Tal instituto surgiu, primeiramente, com parecer dado por Pontes de Miranda em processo envolvendo a Companhia Siderúrgica Mannesman.
Surgiu sob fortes críticas, todavia, após a Constituição Federal de 1988, e ancorado no princípio do contraditório, princípio este que deve ser aplicado em todos os processos judiciais e administrativos (artigo 5º, LV da CF/88), ganhou status de recurso de defesa, todavia, utilizado somente no processo de execução, uma espécie de processo judicial, desde que respeitada a natureza jurídica desta.
Neste sentido, a fundamentação legal implícita da exceção de pré-executividade está na Constituição Federal de 1988, artigo 5º, LV, vez que, embora não expressamente prevista no ordenamento jurídico brasileiro, tal recurso de defesa deve obediência e reverência ao processo de execução, sob pena de esvaziá-lo de sua finalidade. E repita-se, é admitido em razão de construção doutrinário-jurisprudencial.
E qual a sua natureza jurídica? A doutrina é oscilante, mas o entendimento majoritário é no sentido de que se trata de um incidente processual, ou também, uma objeção, vez que se trata de uma forma de defesa.
(c) Inicialmente, o interesse de agir, segundo Marinoni e Arenhart, reside no binômio necessidade + adequação. Há necessidade quando o direito material não pode ser realizado sem a intervenção do Estado-juiz. Já para que haja a adequação é necessário que o provimento jurisdicional seja capaz de remediar a situação narrada na fundamentação do pedido.
E, considerando que a exceção de pré-executividade é um recurso de defesa, não previsto em lei, entendemos que qualquer pessoa pode interpor exceção de pré-executividade, desde que, é claro, tenha interesse na demanda, pois do contrário, seria carecedora de ação, por falta de interesse de agir, a teor do artigo 267, VI, do Código de Processo Civil. Logo, não é necessário que seja o próprio devedor, pode ser o credor/exequente, bem assim um terceiro interessado (acepção esta diversa da preconizada na legislação processual civil – intervenção de terceiros).
Caso interessante é saber se a Fazenda Pública pode utilizar da exceção de pré-executividade. Danilo Felix Louza Leão, citando Cunha, pontua que há uma possibilidade de a Fazenda Pública apresentar exceção de pré-executividade: quando perdido o prazo para embargos, houver uma questão de ordem pública que cause a nulidade da execução ou que enseje sua extinção. Nessa hipótese, segundo o autor, poderá a Fazenda Pública ajuizar a exceção de pré-executividade, defendendo-se por meio de uma mera petição.
Assim sendo, a Fazenda Pública provando haver interesse de agir, poderá interpor exceção de pré-executividade.
E o momento adequado para sua interposição? A doutrina não é pacífica acerca do tema.
Considerando que as matérias objeto da exceção são, em regra, de ordem pública, não estão sujeitas à preclusão, pelo que não deve ser aplicado com rigor o entendimento da existência de um prazo para interposição da medida. Não obstante tal fato, é pacífico o entendimento de que, a partir do momento em que a parte tem conhecimento da nulidade que eiva a execução, deve argüi-la em sua primeira oportunidade.
(d) as matérias passíveis de argüição são aquelas apreciáveis de ofício pelo juiz, bem assim aquelas concernentes aos pressupostos processuais, condições da ação e vícios objetivos do título, referentes à certeza, liquidez e exigibilidade” (STJ, REsp 232.76/PR, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. de 18-12-2001, DJU, 25 mar. 2002, p. 182, apud Odmir Fernandes ET AL., Lei de Execução Fiscal, cit., p. 302).
A interposição de exceção de pré-executividade tem o condão de suspender o trâmite do processo de execução? Particularmente, entendemos que sim, visto que há que se considerar que o objetivo maior do tema em estudo é a possibilidade de defesa do executado sem a necessidade de prévia constrição de seu patrimônio. O ato contínuo no processo de execução, após a citação do devedor que não quita a dívida nem garante a execução, é a penhora. Ora, se não se suspendesse a execução quando da interposição da exceção, o devedor poderia ter seu patrimônio penhorado da mesma forma, perdendo o instituto totalmente seu sentido.
Impende destacar outro questionamento interessante, sé é constitucional dispositivo normativo que estabeleça como condição da ação anulatória a efetivação de depósito do montante integral do débito?
Inicialmente, cumpre destacar a definição de ação anulatória tributária dada por Júlio M. de Oliveira: “meio de provocação do Poder Judiciário, a ser proposto pelos interessados contribuintes ou terceiros em face da Fazenda Pública ou de entidades parafiscais, com vistas a desconstituir o lançamento ou os créditos constituídos nos termos do art. 150 do CTN, sejam decorrentes de obrigação tributária ou de descumprimento de deveres instrumentais tributários ou provenientes de penalidades advindas de normas sancionatórias tributárias ou, ainda, na hipótese de decisão administrativa denegatória de restituição nos termos do art. 169 do CTN. O provimento jurisdicional desta ação possui, pois, conteúdo constitutivo negativo ou meramente constitutivo, na hipótese especial do artigo 169 do CTN.”
E emenda o autor, é uma ação inominada de conhecimento da subespécie constitutiva negativa (desconstitutiva).
Com relação à preceituação contida no artigo 38 da LEF, necessidade de depósito do montante integral para a propositura da ação anulatória, tal ordenança é de um absurdo tamanho.
A propósito, conforme preleciona Júlio M. de Oliveira, a jurisprudência uníssona afastou o supracitado comando normativo em qualquer das hipóteses de cabimento da anulatória tributária e construiu a norma no sentido de harmonizá-la ao conteúdo do artigo 151, II, do CTN, que suspende a exigibilidade do crédito tributário pelo depósito do montante integral do tributo.
Finalizando, o descabimento do depósito como pressuposto de procedibilidade ou como condição da ação anulatória tributária foi exemplarmente afastado nos julgamentos das mais diversas cortes do País, merecendo destaque a Súmula 247 do extinto Tribunal Federal de Recursos, e os acórdãos do Superior Tribunal de Justiça[1] e do Supremo Tribunal Federal[2].
[1] “A doutrina e a jurisprudência enraizaram a compreensão de que o depósito prévio ditado no artigo 38, Lei 6.830/90, não constitui indispensável pressuposto de procedibilidade de ação anulatória de débito fiscal.” (Acórdão REsp 183.969/SP, DJ de 22/5/2000, relator Milton Luiz Pereira, 1ª Turma do STJ). No mesmo sentido REsp 60.064/SP e REsp 2.772/RJ, dentre diversos.
[2] “A Ação anulatória de débito fiscal. Depósito prévio. Art. 38 da lei de execuções fiscais (Lei 6.830/80). Pressuposto da ação anulatória de ato declaratório da dívida ativa é o lançamento do crédito tributário, não havendo sentido em protraí-lo ao ato de inscrição da dívida. O depósito preparatório do valor do débito não é condição de procedibilidade da ação anulatória, apenas, na circunstância, não é impeditiva da execução fiscal, que com aquela não produz litispendência, embora haja conexidade. Entretanto, a satisfação do ônus do depósito prévio da ação anulatória, por ter efeito de suspender a exigibilidade do crédito (art. 151, II do CTN), desautoriza a instauração da execução fiscal. Recurso Extraordinário não conhecido.” (Acórdão, RE 103.400-9/SP, DJ de 1º/2/1985, relator Rafael Mayer, 1ª Turma do STF)

sexta-feira, 26 de março de 2010

O STJ e a responsabilidade tributária do sócio

Por Bianca Delgado Pinheiro
Trata-se a responsabilidade tributária do deslocamento da sujeição passiva do contribuinte para outrem (responsável tributário). A responsabilidade tributária por transferência ocorre após o fato gerador da obrigação tributária, ou seja, a lei diz que o sujeito passivo é o contribuinte, mas por razões supervenientes ao fato gerador, a responsabilidade é deslocada para o responsável, no caso em análise, para o sócio gerente, diretor ou administrador da sociedade, nos termos do artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN).
Destaque-se, de pronto, que tal responsabilidade pessoal dos sócios em relação às obrigações tributárias porventura inadimplidas pela sociedade somente se justifica nas exaustivas hipóteses do artigo 135 do CTN, quais sejam, ocorrência de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos.
Não é demais ressaltar que o STJ já decidiu que o “simples inadimplemento não caracteriza infração legal”.
Corriqueiramente, são ajuizadas execuções fiscais, incluindo-se, aleatoriamente, os sócios no pólo passivo, ao não se localizar bens da sociedade passíveis de penhora. Em defesa, os sócios tidos como coobrigados das dívidas fiscais das empresas, manifestam-se no processo, mediante a chamada exceção de pré-executividade, que prescinde de garantia em juízo e prova, evidenciando que não há no processo a prova da ocorrência de qualquer fraude, a ensejar a sua responsabilidade tributária.
Ocorre que, recentemente, o STJ firmou o entendimento de que o ônus da prova na comprovação da responsabilidade de sócio cujo nome não consta da CDA é do exequente/Fazenda. Mas, de outra feita, surpreendentemente, cabe ao executado/sócio a prova de sua ilegitimidade passiva, quanto seu nome constar da Certidão de Dívida Ativa (CDA), em face da presunção de liquidez, certeza e exigibilidade deste título. Tal entendimento deverá ser aplicado a todos os processos em andamento em que se discute o mesmo tema.
Com fundamento absolutamente simplista, o STJ acabou por impedir, em muitos casos, a defesa do sócio, sem prévia garantia do crédito tributário. Ou seja, ainda que seja evidentemente ilegítimo para figurar o pólo passivo da execução fiscal, dada a inexistência de causa para a sua responsabilidade tributária, terá o sócio que oferecer bens ou dinheiro suficiente à garantia da dívida fiscal, para possibilitar a sua defesa em Embargos do Devedor, e, assim, tentar se ver livre de execução instaurada contra o mesmo de forma absolutamente irregular e ilegal.
Além do mais, terá que produzir prova de cunho negativo, ou seja, prova de que não agiu com fraude ou dolo, inexistindo sequer qualquer procedimento da Fazenda para tal constatação.
A Procuradora da Fazenda Nacional, confortável com tal posicionamento do STJ, editou a
Portaria 180, publicada em 25 de fevereiro de 2010, com orientações aos procuradores fazendários quanto aos procedimentos a serem seguidos por estes para a responsabilização dos sócios da empresa com dívida fiscal.
Ainda que conste no artigo 2º da dita portaria interna que a inclusão do responsável solidário na Certidão de Dívida Ativa da União somente ocorrerá quando da ocorrência de excesso de poderes, infração à lei, infração ao contrato social ou estatuto ou dissolução irregular da pessoa jurídica, foi admitida tal constatação por mera declaração fundamentada da autoridade competente da Secretaria da Receita Federal do Brasil (RFB) ou da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN).
Ora, a inclusão do sócio na CDA, para fins de responsabilidade tributária, somente poderá ocorrer após competente processo administrativo em que seja comprovada a existência de infração à lei, contrato ou estatuto social. Simples declaração da RFB ou da PGFN não é o bastante para tanto, configura-se, na realidade, absoluta arbitrariedade e amplo poder discricionário, não permitido nesse caso.
Diante do exposto, é certo que o entendimento do STJ, ao invés de solucionar antigo entrave judicial, decorrente de arbitrariedades da Fazenda Pública e de sua Procuradoria, acabou por criar novas discussões, na defesa ao respeito à legalidade na atribuição da responsabilidade tributária dos sócios em executivos fiscais, representando, nada mais, do que a aceitação da desconsideração da personalidade jurídica da empresa devedora, sem a existência das condições para tanto.
E, além de notórios procedimentos burocráticos que retardam ou impedem a constituição de sociedades geradoras de recursos, a responsabilidade pessoal dos sócios pelas obrigações tributárias da empresa, da forma como vem sendo empregada, certamente, será forte desestímulo ao empreendedor brasileiro.

terça-feira, 16 de março de 2010

Royalties da discórdia.

Discussão deve desaguar no Supremo, diz Ives Gandra

A redistribuição para todo o país de royalties vindos da exploração do petróleo, aprovada pela Câmara dos Deputados, promete ainda muita polêmica, aponta reportagem da Agência Brasil. O tributarista Ives Gandra da Silva Martins aposta que, qualquer que seja o caminho adotado para mudar a forma atual de distribuição, a discussão necessariamente vai desaguar no Supremo Tribunal Federal.
Apesar de concordar com a distribuição de royalties para todo o país, Gandra considera que a Emenda Ibsen, como ficou conhecida, que prevê a distribuição dos royalties para todos os estados e municípios brasileiros utilizando o critério do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) e do Fundo de Participação dos Estados (FPE), fere a Constituição.
“Pessoalmente, considero a medida justa, mas ela é inconstitucional. Eu tenho a sensação que riquezas nacionais deveriam ser divididas por todo o país. Mas a Constituição declara no artigo 20, claramente, que a riqueza pertence aos municípios onde as riquezas vão ser exploradas e, por essa razão, só por uma emenda constitucional [PEC] poderia se alterar isso. Da forma como foi colocada, por meio de legislação, não por uma PEC, tenho a impressão que o presidente vai vetar por ser inconstitucional. Fere o artigo 20 da Constituição”, explicou.
A nova redistribuição retira recursos dos principais produtores de petróleo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e São Paulo, em favor dos demais estados e municípios. A proposta, aprovada na Câmara na última quarta-feira (10/3) por 369 a 72, com duas abstenções, abrange a distribuição dos royalties do petróleo em todo país, incluindo a extração da camada pré-sal.
A emenda prevê que os royalties sejam divididos entre estados e municípios, metade para cada, seguindo ainda as porcentagens de divisão dos fundos de participação dos estados e dos municípios (FPE e FPM). A receita do Espírito Santo, por exemplo, passaria de pouco mais de R$ 313 milhões, obtida em 2009, para R$ 157 milhões. A do Rio de Janeiro cairia de R$ 4,9 bilhões para R$ 159 milhões.
Ainda que seja por meio de uma PEC, o tributarista Ives Gandra acredita que a questão terá que ser decidida pelo Supremo porque toca no chamado pacto federativo. “Muitos alegarão que isso fere o pacto federativo. Como no artigo 60, parágrafo 4º da Constituição a Federação é intocável, muitos alegarão que haverá um ferimento, uma mácula na Constituição. Haverá um questionamento dos que defendem a impossibilidade de mudança de quaisquer dos fundamentos da atual Federação”, explicou o tributarista.
O ponto de questionamento, para Gandra, será a autonomia financeira dos municípios produtores. O pacto federativo garante a todos os entes federados a chamada tríplice autonomia, ou seja, autonomia política, financeira e administrativa. "Os municípios produtores vão alegar que houve uma redução da sua autonomia financeira com a mudança”, aposta.
“Eu, particularmente, entendo que o que a Constituição proíbe é que se elimine o pacto federativo, que se elimine a Federação, e não que ela [a Federação] não possa ganhar perfil diferente de acordo com a própria mudança, com os desafios do século, com as necessidades de readaptação do país a essa economia centralizada, globalizada e, ao mesmo tempo, as reformulações conceituais que representam hoje o conceito de soberania, com formação de blocos regionais”, opinou.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

O prazo da execução fiscal em dissolução irregular de empresa.

Por André Almeida Rodrigues

Atualmente verificamos controvérsias acerca do prazo que a Fazenda Pública dispõe para promover o redirecionamento de uma execução fiscal em face da pessoa do sócio-gerente (1) no caso de ter havido o encerramento das atividades da empresa. Importante anotar que o fechamento da empresa, sem que tenham sido pagas todas as suas obrigações fiscais (2), é o suficiente para fazer incidir a regra de responsabilização contida no artigo 135, III do Código Tributário Nacional (3).
Eis o entendimento há muito pacificado no Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. COMPROVADA DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA EMPRESA. REDIRECIONAMENTO. RESPONSABILIDADE. SÓCIO-GERENTE. ART. 135, III, DO CTN. RETORNO DOS AUTOS.
1. Não é omisso o aresto que examina exaustivamente os documentos constantes dos autos e decide de forma fundamentada, apesar de contrária à pretensão do recorrente. Inexistência de violação do artigo 535, II, do Código de Processo Civil.
2. Quando a sociedade se extingue irregularmente, como no caso, cabe responsabilizar o sócio-gerente, permitindo-se o redirecionamento. Assim, é dele o ônus de provar não ter agido com dolo, culpa, fraude ou excesso de poder. Precedentes.
3. Estabelecida a possibilidade de redirecionamento do feito, os autos devem retornar ao Tribunal a quo para que sejam apreciadas as demais questões suscitadas nas apelações interpostas perante aquela Corte.
4. Recurso especial provido.(REsp 1091301/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2009, DJe 11/11/2009)
Superada esta questão, cabe frisar que a única hipótese de prescrição intercorrente (4) hoje positivada em nosso ordenamento é aquela prevista no parágrafo 4º do artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais. (5)
Tal instituto visa a coibir que o processo fique indefinidamente arquivado à espera de alguma providência do credor. Decorrido o prazo prescricional (contado da decisão que ordenou o arquivamento) sem a localização do devedor ou de bens passíveis de penhora, o processo deverá ser extinto com julgamento de mérito.
Pois bem.
Neste ponto destaca-se o entendimento de alguns, segundo o qual seria aplicável o prazo prescricional intercorrente de cinco anos para o redirecionamento da ação em relação aos sócios-gerentes, no caso de ter havido dissolução irregular da empresa. E referido prazo seria contado a partir da ordem para citação da empresa. Assim, a Fazenda teria cinco anos, contados da ordem de citação da empresa, para promover o redirecionamento e a responsabilização dos sócios-gerentes.
Referido entendimento teria fundamento no artigo 174 do Código Tributário Nacional (6), combinado com o disposto na recente Súmula Vinculante 08 do Supremo Tribunal Federal, que expressamente fixou o prazo de cinco anos para a cobrança judicial das Fazendas. Porém, em sendo constatada a dissolução irregular da empresa, e mesmo se admitindo outra hipótese de prescrição intercorrente que não a do artigo 40 da Lei de Execuções Fiscais, não parece ser aquele o melhor entendimento.
Como sabido, o instituto da prescrição obriga o credor a ajuizar, a distribuir, a ação de cobrança do crédito no prazo de cinco anos (7), contados da sua constituição definitiva. Diz, pois, com a inércia do titular da ação. “Dizer que a ação para cobrança do credito tributário prescreve em cinco anos significa dizer que a Fazenda Pública tem o prazo de cinco anos para cobrar judicialmente, para propor a execução do credito tributário.” (8)
Ou seja, a credora tem um lustro para cobrar a dívida em juízo, inicialmente da empresa devedora.
Se, porém, no curso do processo, ficar constatado o fechamento de suas portas, o prazo prescricional para o redirecionamento, caso o admitamos, não pode ter como termo inicial o “cite-se” proferido logo após a distribuição da ação, até porque não raras vezes somente se constata nos autos a dissolução irregular após o sexto ano do ajuizamento (ou mais). Além disso, a credora só passou a ter interesse em ver o sócio-gerente no pólo passivo quando obteve a notícia da dissolução irregular, a qual geralmente se dá por meio de certidão do oficial de justiça, após diligências in loco). Não antes.
Em outras palavras, até a data em que se teve notícia formal do encerramento irregular das atividades da empresa, os sócios sequer poderiam integrar o pólo passivo da demanda, exatamente em razão de serem distintas as personalidades jurídicas da sociedade e dos sócios.
Assim, não poderia ter início a contagem de prazo prescricional. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou a respeito:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. REDIRECIONAMENTO. CITAÇÃO DA EMPRESA E DO SÓCIO-GERENTE. PRAZO SUPERIOR A CINCO ANOS. PRESCRIÇÃO. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA.
1. O Tribunal de origem reconheceu, in casu, que a Fazenda Pública sempre promoveu regularmente o andamento do feito e que somente após seis anos da citação da empresa se consolidou a pretensão do redirecionamento, daí reiniciando o prazo prescricional.
2. A prescrição é medida que pune a negligência ou inércia do titular de pretensão não exercida, quando o poderia ser.
3. A citação do sócio-gerente foi realizada após o transcurso de prazo superior a cinco anos, contados da citação da empresa. Não houve prescrição, contudo, porque se trata de responsabilidade subsidiária, de modo que o redirecionamento só se tornou possível a partir do momento em que o juízo de origem se convenceu da inexistência de patrimônio da pessoa jurídica. Aplicação do princípio da actio nata.
4. Agravo Regimental provido. (AgRg no REsp 1062571/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/11/2008, DJe 24/03/2009).
Portanto, na hipótese de se admitir a prescrição intercorrente no caso de redirecionamento da execução fiscal, seu termo inicial deverá ser a data da ciência do credor sobre o encerramento irregular das atividades da empresa executada.
Referência
1. Aquele que tem poder de administração.
2. Chamada “dissolução irregular”.
3. Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: III - os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.
4. Que se dá no curso do processo.
5. Art. 40 - O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. parágrafo 4 Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051, de 2004)
6. Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva. Parágrafo único. A prescrição se interrompe: I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal; (Redação dada pela Lcp nº 118, de 2005)7. 30 anos para cobrança do FGTS.8. Hugo de Brito Machado, in Curso de Direito tributário, 22ª edição, ed. Malheiros, pág. 195.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

IPI e ICMS não incidem em importação para uso próprio.

Por Gabriel Quintanilha

Com a globalização, o comércio entre as nações se desenvolveu em proporções nunca antes vistas. Atualmente, o indivíduo pode adquirir bens produzidos no exterior, sem que seja necessário sair de sua mesa de trabalho.

Com a inclusão digital e desenvolvimento das compras online, o contribuinte passou a ter acesso a produtos estrangeiros de forma rápida e segura. No entanto, antes de efetuar uma aquisição de produto estrangeiro, o consumidor deve estar atento quanto à incidência de tributos. O ordenamento jurídico pátrio exonerou as exportações da carga tributária, porém, ela recai de forma pesada nas entradas de produtos estrangeiros no território nacional, ou seja, na importação.

Com a finalidade de evitar o alto preço dos tributos, o contribuinte deve estar atento com o posicionamento dos Tribunais Superiores e atualmente resta pacífico o entendimento no sentido que a importação para uso próprio não gera impostos como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).

Tal limitação é clara tendo em vista que para a incidência do ICMS, pressupõe-se a existência de uma mercadoria, ou seja, a busca pelo lucro com a circulação de um produto.

Já no tocante ao IPI, o entendimento deve ser o mesmo, já que também se submete ao princípio da não-cumulatividade, na forma do art. 153, parágrafo 3º, II da CRFB.

Neste sentido, segue o julgado do STJ:
“TRIBUTÁRIO. IPI. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. VEÍCULO AUTOMOTOR. PESSOA FÍSICA. NÃO-INCIDÊNCIA. ENCERRAMENTO DA MATÉRIA PELO COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. Recurso especial interposto contra acórdão que determinou o recolhimento do IPI incidente sobre a importação de automóvel destinado ao uso pessoal do recorrente.
2. Entendimento deste relator, com base na Súmula nº 198/STJ, de que “na importação de veículo por pessoa física, destinado a uso próprio, incide o ICMS”.
3. No entanto, o colendo Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida no REnº 203075/DF, Rel. p/ acórdão Min. Maurício Corrêa, dando nova interpretação ao art. 155, § 2º, IX, 'a', da CF/88, decidiu, por maioria de votos, que a incidência do ICMS sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, não se aplica às operações de importação de bens realizadas por pessoa física para uso próprio. Com base nesse entendimento, o STF manteve decisão do Tribunal de origem que isentara o impetrante do pagamento de ICMS de veículo importado para uso próprio. Os Srs. Ministros Ilmar Galvão, Relator, e Nelson Jobim, ficaram vencidos ao entenderem que o ICMS deve incidir inclusive nas operações realizadas por particular.
4. No que se refere especificamente ao IPI, da mesma forma o Pretório Excelso também já se pronunciou a respeito: “Veículo importado por pessoa física que não é comerciante nem empresário, destinado ao uso próprio: não-incidência do IPI: aplicabilidade do princípio da não-cumulatividade: CF, art. 153, § 3º, II. Precedentes do STF relativamente ao ICMS, anteriormente à EC 33/2001: RE 203.075/DF, Min. Maurício Corrêa, Plenário, 'DJ' de 29.10.1999; RE 191.346/RS, Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, 'DJ' de 20.11.1998; RE 298.630/SP, Min. Moreira Alves, 1ª Turma, 'DJ' de 09.11.2001” (AgReg no RE nº 255682/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ de 10/02/2006).
5. Diante dessa interpretação do ICMS e do IPI à luz constitucional, proferida em sede derradeira pela mais alta Corte de Justiça do país, posta com o propósito de definir a incidência do tributo na importação de bem por pessoa física para uso próprio, torna-se incongruente e incompatível com o sistema jurídico pátrio qualquer pronunciamento em sentido contrário.
6. Recurso provido para afastar a exigência do IPI”.
(REsp 937.629/SP, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18.09.2007, DJ 04.10.2007 p. 203).

Assim, resta claro que o importador, pessoa física, que importe produtos estrangeiros para uso próprio, não deverá ser considerado contribuinte do ICMS ou do IPI.

Ademais, entendemos ainda que não incidem tais tributos ainda que a importação seja realizada por pessoa jurídica que não seja contribuinte dos referidos impostos. Vejamos:
EMENTA: DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DE BENS, PARA USO PRÓPRIO, POR EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇOS MÉDICOS: NÃO-INCIDÊNCIA DO ICMS. Não se sujeita ao ICMS a importação de bens, para uso próprio, por empresa prestadora de serviços médicos, não comerciante, inclusive a partir da Emenda Constitucional nº 33, de 11/12//2001. Aplicação dos arts. 155, II, da Constituição Federal (que sujeita apenas a ¨mercadoria¨ ao ICMS, como tal entendido o bem móvel adquirido com o intuito de revenda habitual, mediante lucro), e do art. 110 do Código Tributário Nacional (que veda à lei instituidora do imposto alterar o sentido das palavras, institutos, conceitos, formas ou figuras do direito privado, utilizadas, pela lei constitucional, para definir ou limitar competências tributárias). Apelo desprovido, por unanimidade. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70011092616, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roque Joaquim Volkweiss, Julgado em 13/04/2005)

Por óbvio não deve incidir o ICMS, principalmente se levarmos em consideração que o consumidor final não é contribuinte do tributo, suportando somente o ônus financeiro.
P
or fim, resta claro que IPI e o ICMS não devem incidir nas importações para uso próprio, sob pena de violar o ordenamento jurídico pátrio.